III - Os Centros de Tradição na àrea de Colonização Alemã

TERCEIRA PARTE DO TEXTO:EM BUSCA DO TEMPO PERDIDO: O MOVIMENTO TRADICIONALISTA GAÚCHO(Ruben Oliven)

Os tradicionalistas ficaram intrigados com o fato de que o primeiro CTG surgido depois do ‘35’ - o Fogão Gaúcho - foi fundado, em 7 de agosto de 1948, em Taquara, cidade localizada em área de colonização alemã.“Nós procurávamos divulgar, o objetivo desde os estatutos era divulgar as nossas tradições nos países vizinhos e nos estados irmãos, nós tínhamos um sentido de expansão através dos outros estados. E o primeiro CTG, a primeira resposta, veio de Taquara, da região colonial alemã, que nos perturbou todos os nossos objetivos. Nós achávamos que viria eventualmente da Campanha e veio da região colonial alemã. (7)Como vimos, os fundadores do‘35’ era jovens estudantes interioranos, descendentes de pequenos proprietários rurais da área de latifúndio. Praticamente todos tinham sobrenomes de origem portuguesa. (8)Os fundadores do CTG Fogão Gaúcho, ao contrário, eram adultos, boa parte com ascendência alemã. À semelhança do que pode ter ocorrido com os dois CTGs pioneiros, criados em área de colonização alemã durante a Segunda Guerra Mundial, os fundadores do Fogão Gaúcho pretendiam afirmar sua brasilidade e sua ‘gauchicidade’. Isso transparece em entrevistas que concederam. Alguns participantes da roda de chimarrão tinham necessidade“de se afirmar, perante a sociedade taquarense, como gaúchos e não como ‘estrangeiros’. Porque muitos deles, sendo de origem alemã, ainda sentiam as influências negativas da perseguição sofrida durante a Segunda Guerra Mundial, como suspeitos de pertencerem à ‘quinta-coluna’ (...) Possivelmente não era esta a intenção da maioria daqueles que se associaram ao CTG, após a sua fundação, mas certamente alguns dos novos sócios tinham estas intenções” (Jacobus,1985, pp. 2-3).
O surgimento de entidades tradicionalistas fora da área pastoril de colonização portuguesa do Rio Grande do Sul - mais especificamente, em áreas de colonização alemã e italiana - coloca uma questão importante: a hegemonia da cultura gaúcha, no sentido pampeano (9), num estado que sofreu as mais variadas influências culturais. Não se trata de fenômeno restrito à área dos latifúndios de pecuária, onde o modelo teve origem. Essa hegemonia atinge as áreas de minifúndio colonizadas por alemães e italianos, onde nunca existiu semelhante complexo pastoril.
A figura do gaúcho, com suas expressões campeiras, envolvendo o cavalo, a bombacha, o chimarrão e a representação de um tipo social livre e bravo, serviu de modelo para grupos étnicos diferentes, unindo os habitantes do estado em contraposição ao resto do pais.Teixeira observa que, no Rio Grande do Sul, o termo ‘colono’ tem origem histórica bem definida, associada ao processo de colonização por imigrantes europeus que praticavam agricultura familiar em pequenas propriedades. Mais do que desvalorizada, essa atividade chegava a ser considerada degradante, diante de uma pecuária que dominava a paisagem do estado desde a colonização portuguesa.Assim, além de designar os imigrantes e seus descendentes, desde o começo da colonização alemã e italiana o termo colono, “no nível das representações, significava, sobretudo, carência de certos atributos positivamente considerados. Colono remetia à noção de pessoa com carência de ambição, de traquejo social, de elegância, de postura corporal e comportamental, de senso de oportunidade e de progresso, de arrojo, de perspicácia, de sagacidade” (Teixeira, 1988, p. 54). É expressiva a presença, no Rio Grande do Sul, de empresários e políticos de origem alemã e italiana, a ponto de seis governadores com sobrenomes italianos terem exercido o poder entre 1955 (quando a imigração italiana completou oitenta anos) e 1979. Mas o tipo social representativo continua a ser o gaúcho, idealizado pelos imigrantes e considerado superior (Willems, 1946; Roche, 1969; Azevedo, 1982). Os fazendeiros eram a camada social mais poderosa do estado. Além disso, o principal símbolo do gaúcho era o cavalo, animal que, na Europa, era. apanágio e marca de distinção da aristocracia rural. Ao chegarem ao Brasil, uma das primeiras providências dos colonos era adquirir esse tipo de montaria, logo que possível (Willems, 1944; Bastide, 1964). Identificando-se com o gaúcho, eles experimentavam uma forma simbólica de ascensão social. No outro extremo, as figuras do índio e do negro têm uma presença extremamente pálida nessa representação.
CONTINUA NA PRÓXIMA POSTAGEM
Autor: Rubem OlivenFonte:
http://www.anpocs.org.br/